Ministério Público Eleitoral nega pedido de Testa para retornar ao cargo de vereador

Veja na íntegra a decisão;  
           Trata-se de ação de impugnação de mandato eletivo - AIME, ajuizada pela
promotoria eleitoral da 36ª Zona Eleitoral - Tabatinga/AM em face de todos os candidatos
constantes no DRAP do PSL, sob a alegação de fraude à cota de gênero, prevista no art. 10, §3º, da Lei nº 9.504/97, em razão da identificação de candidatura fictícia feminina, no caso, a
senhora LUCIANE DE SOUZA FRANCO.

Destacou a inicial que a referida candidata obteve votação zerada e nãorealizou nenhum ato de campanha.

A ação foi julgada PROCEDENTE pelo juízo a quo, nos termos da sentença consignada no ID 11685990, que determinou as seguintes medidas:

A cassação dos candidatos eleitos vinculados ao Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários – DRAP do Partido Social Liberal – PSL – de Tabatinga/AM;

A declaração de inelegibilidade de Luciane de Souza Franco pelo prazo
legal;

A nulidade dos votos obtidos pelas chapas proporcionais, com o recálculo
dos votos dos quocientes eleitoral e partidário, com fulcro no art. 222 do
Código Eleitoral;


O levantamento do segredo de justiça, tornando público o presente julgamento, nos termos do § 11, art. 14, da Constituição Federal (§ 1º, art. 223, Resolução TSE nº 23.611/2019).

Inconformado, LUCIVALDO QUEIROZ SORIANO interpôs recurso eleitoral, no ID 11685995, alegando, em síntese, que a não realização de campanha explícita não pode levar à presunção de candidatura fictícia, e que o conjunto probatório colhido nos autos não seria insuficiente a demonstrar a efetiva fraude à cota de gênero.

Remetidos os autos ao TRE, o recurso foi desprovido, nos termos da ementa
a seguir transcrita:

RECURSO ELEITORAL. AIME. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. PROVA DE FATO IMPEDITIVO CONSUBSTANCIADA EM DECLARAÇÃO DO PRÓPRIO PARTIDO. DOCUMENTO PRODUZIDO
UNILATERALMENTE. AUSÊNCIA DE FÉ PÚBLICA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

I – Para a caracterização da fraude à cota de gênero é indispensável prova robusta da presença dos pressupostos constitutivos, a saber: (1) ausência de
obtenção de votos, (2) ausência da prática de atos de campanha eleitoral, (3) ausência de movimentação de recursos na prestação de contas eleitorais.
II – Na hipótese dos autos, o recorrente vale-se de declaração do próprio partido como prova de fato impeditivo ao direito do recorrido, referente à
suposta doação pelo partido de recursos estimáveis em dinheiro à campanha eleitoral da candidatura feminina fictícia. Contudo, conforme jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, documento produzido unilateralmente não possui fé pública.

III – Recurso conhecido, mas desprovido.


          Passo seguinte, Lucivaldo Queiroz Soriano opôs embargos declaração no ID 11714014, alegando que o tribunal, ao julgar improcedente o recurso, teria incidido em premissa fática equivocada e também invertido o ônus probatório, ao exigir que o partido
demonstrasse a movimentação de recursos da candidata Luciene de Souza Franco, haja vista a
cláusula de sigilo bancário aplicado a esses dados.

Pois bem. Adianta-se que não assiste razão ao embargante.

           Muito embora de fato se admita a oposição de embargos quando a decisão recorrida se fundar em premissa fática equivocada, não é essa a situação dos autos.

           Como já dito por ocasião do relatório, a fraude à cota de gênero discutida nos autos tem por fundamento a constatação de que a senhora Luciane de Souza Franco, embora
registrada como candidata ao cargo de vereador, no pleito de 2020, não realizou campanha, não obteve nenhum voto, não arrecadou receitas e nem comprovou despesas.

          Conforme o voto do relator, a alegação do partido para contrapor a alegação de
fraude limitou-se a afirmar que todos os candidatos, inclusive a candidata Luciene de Souza
Franco, receberam da agremiação partidária a doação de recursos estimáveis em dinheiro,
consistente em material impresso de propaganda eleitoral.

           Correto, portanto, o acórdão embargado ao destacar que a declaração do
próprio partido constitui documento produzido unilateralmente, destituído de fé pública, não
servindo, assim, de prova da ausência do pressuposto constitutivo do ilícito em questão,
referente à ausência de receitas e despesas na prestação de contas.

            Acerca desse ponto, leia-se o seguinte trecho do voto do relator:

"Da mesma forma, a prova da ocorrência da movimentação de recursos na campanha eleitoral, para afastar a fraude à cota de gênero, não pode ser
constituída de documento produzido unilateralmente, pois destituído de fé pública. Para tanto, deveria o recorrente apresentar demonstrativo constante do processo de prestação de contas, comprovando a doação dos recursos estimáveis em dinheiro, afastando qualquer presunção de que o documento foi produzido a posteriori, apenas para servir como prova contrária na representação por fraude à cota de gênero.
 

Não se trata, ressalte-se, de inversão do ônus da prova, uma vez que, nos termos do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil[1], o ônus da prova incumbe ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, que é a ausência de um dos elementos constitutivos do direito do autor, impedindo que este se complete[2]. Ou seja, cabia ao recorrente provar adequadamente a existência de movimentação de recursos nas contas eleitorais da candidata Luciene de Souza Franco (fato impeditivo), afastando, assim, a caracterização da fraude à cota de gênero, em face da ausência do pressuposto da falta de receitas e despesas na prestação de contas da candidata (elemento constitutivo do ilícito). 

Para afastar a caracterização do ilícito, o recorrente alega que, não obstante não terem recebido recursos financeiros, todos os candidatos do partido, inclusive a candidata Luciene de Souza Franco, receberam da agremiação partidária a doação de recursos estimáveis em dinheiro, consistente em material impresso de propaganda eleitoral, conforme. declaração do partido constante dos autos (ID11685936). Contudo, a declaração do próprio partido constitui documento produzido unilateralmente, destituído de fé pública, não servindo, portanto, de prova da ausência do pressuposto constitutivo do ilícito em questão referente à ausência de receitas e despesas na prestação de contas."


           Sabe-se que os embargos de declaração são cabíveis contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição, para suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento e para corrigir erro material, conforme dicção do art. 1.022, incisos I, II e III do CPC c/c o art. 275, § 1º, do
Código Eleitoral.

            No caso, porém, não foi demonstrada a alegada premissa fática equivocada ou algum outro vício no acórdão embargado a ensejar a integração do julgado, pois a fundamentação adotada é clara e suficiente para respaldar a conclusão alcançada, sendo evidente a intenção do embargante no sentido de rediscutir o mérito da causa, por meio de recurso inapropriado para tanto.

  Dessa forma, não tendo sido demonstradas quaisquer das hipóteses que permitem a oposição dos embargos declaratórios, nos termos do art. 275 do Código Eleitoral, MANIFESTA-SE o MINISTÉRIO PÚBLICO pela sua REJEIÇÃO.



RAFAEL DA SILVA ROCHA
PROCURADOR REGIONAL ELEITORAL 

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